segunda-feira, 5 de julho de 2010

ESBOÇO DE UM PROJETO DE CIDADANIA ENVOLVENDO OS ESTUDANTES DA ESCOLA

CULTURA DE PAZ: PAZ, COMO É QUE SE FAZ?
MEMORANDO DO PROJETO MUTIRÃO DE LIMPEZA E CIDADANIA ESCOLA
Pra começo de conversa
Prof. Sérgio Donizeti Ferreira
Em 2009 eu trabalhava em dois turnos da Escola Municipal Glória Marques Diniz, no da manhã e da tarde. Pela manhã, tinha dez turmas no 3º ciclo, lecionava a disciplina Ensino Religioso. À tarde, além de ensino religioso, também dava aulas de história para o 3º ano do 2º ciclo.
Bem, a escola estava ficando visivelmente suja com o aumento das pichações, principalmente nas salas de números 25 ao 30. Eu não trabalhava diretamente nestas salas, mas percebia que as salas do andar de cima também apresentavam um aumento dos rabiscos nas paredes e, claro, as pichações.
Então, à tarde, eu e a supervisora Sandra conversamos com alguns estudantes da sala 12, a qual era uma das mais afetadas, ali estudavam alunos do 3º ano do 2º ciclo. Achávamos que alguns dos garotos desta turma a estavam pichando. Porém, logo pude concluir que ou eles não eram os únicos a pichá-la ou não eram eles e sim os que usavam a sala pela manhã. Digo isso porque estes garotos se tornaram nossos “aliados” denunciando o aparecimento de novas pichações. Esse fato foi muito interessante e me fez encorajá-los a limpar a sua própria sala.
No final do mês de dezembro realizamos a tão limpeza da sala. Essa experiência foi muito positiva e nos fez refletir.
Pela manhã propus a mesma atividade para a turma da sala 14, na qual estudavam alunos de 2º ano do 3º ciclo. Fiz isso porque as paredes desta sala também estavam um pouco sujas. Usei o argumento junto aos estudantes de que a sala era deles, era nossa, e que, portanto, caberia a nós todos decidir o modo como queríamos aquele espaço. Deveríamos intervir nele e colaborar na sua manutenção. No principio um pouco de resistência, mas isso não me assustou. Argumentei que seria uma aula prática de cidadania; minha intenção não era castigá-los e, sim, que eles participassem de uma forma mais direta da vida da escola. Ao final da nossa conversa os estudantes concordaram em cooperar.
A (in) experiência e o aprender fazendo
Depois de termos a idéia do que íamos fazer e de conversar com essas duas turmas, passei a correr atrás de quem entendia sobre o assunto limpeza de pichações na escola, ou seja, a equipe que trabalha na manutenção da limpeza dentro da escola. As componentes dessa equipe me deram as dicas: usar álcool, esponja, esponja de aço, água e panos velhos. Recordo que numa certa vez eu pedi a duas delas que fossem à sala da turma da manhã para orientarem aos estudantes sobre como deveria ser o procedimento da limpeza das paredes. Os estudantes não deram muita idéia, mas escutaram.
Eu diria que desde o inicio tudo foi uma novidade para mim. Eu nunca tinha feito nada parecido; era a primeira vez que eu me lançava numa proposta deste tipo dentro da escola ao longo dos poucos anos de trabalho na escola. Por isso acho que desde o inicio tudo foi aprendizado.
Botando a mão na massa
Nos últimos dias letivos de 2009 realizamos o trabalho de limpeza nas salas. Na turma da tarde participaram 13 estudantes, o professor de educação física, Ricardo, e eu, professor de ensino religioso. Na turma da manhã, participaram 7 estudantes da turma, 5 garotos e 2 garotas.
O que chamou minha atenção foi que nas duas turmas havia um sentido gregário bem evidente, ou seja, dava a entender que para os que “botaram a mão na massa” era como se cada um inconscientemente dissesse “eu estou aqui porque meu colega, meu parceiro, também está”.
Na turma da manhã eu notei certa “vergonha” de começar o trabalho, mas depois que uns dois iniciaram os outros tomaram coragem também foram. Em resumo eu digo que foi uma experiência muito gratificante e interessante. Explico! Gratificante porque à medida que a coisa ia acontecendo surgia uma cumplicidade entre todos nós em relação ao projeto. Interessante porque era uma descoberta nova para todos nós e ao mesmo tempo um aprendizado, um aprender juntos.
Algumas falas soltas de que não me esqueci, exemplos como: “nunca pensei que eu fosse fazer um trabalho assim”; “agora se eu vir alguém rabiscando a parede eu corto o dedo dele”.
Uma práxis dialética
Recordo que quando eu e a turma da manhã concluímos o trabalho todos estavam satisfeitos com o resultado do trabalho. No momento em que estávamos lavando os panos e recolhendo o material de trabalho o Henrique fez uma sugestão da qual não me esqueci: “que tal a gente fazer um projeto para limpar a escola?” Eu imediatamente respondi: “Eu topo”. Completei dizendo que em 20010 voltaríamos a conversar. Ali mesmo combinamos que faríamos uma confraternização pelo que nós tínhamos feito: eu bancaria as pizzas e os meninos decidiram rachar o refri. No dia seguinte fomos para o abraço e realizamos o combinado.
Acima usei um subtítulo ou meio pomposo, intelectualmente falando, ou, no mínimo ininteligível para as pessoas que desconhecem o jargão. Mas vamos lá. O que quero dizer é bem simples. Práxis porque foi uma ação e uma ação pensada e realizada tendo uma intencionalidade. Uma ação que tem a ver com um modo de ser e estar no mundo e, principalmente, uma maneira de pensar e vivenciar a proposta concreta de uma escola cujo objetivo é provocar a dinâmica da educação, da formação de outras pessoas. O termo dialético quer transmitir a noção de que quando duas pessoas ou mais se põem em relação elas se afetam mutuamente, de tal modo que nenhuma das duas saem do mesmo modo que entraram. Isso vale para o nosso pensamento, o modo como avaliamos a vida e como organizamos o mundo à nossa volta ou as próprias idéias que temos. Basta pararmos pra “trocar idéia com alguém” ou meditarmos sobre o que fizemos ao longo de nosso dia para refazermos nossas posições sobre o mundo, nossas opiniões etc.
O primeiro semestre de 2010 e a organização do mutirão de limpeza
Iniciamos o ano de 2010 e a pessoa com quem primeiro conversei foi o Henrique. Ele se mostrava disposto a levar avante a idéia inicial. Então, marcamos com os outros quatro garotos, o João Vitor, o Guilherme, o Willimar e Giovanni, de conversar sobre a proposta.
O primeiro combinado nosso foi: passar em todas as salas e convidar voluntários para participar do projeto. Esse foi um momento muito significante para mim pois passávamos nas salas juntos, eles e eu. Eu os encorajava a falarem sobre o projeto e eles deram conta do recado direitinho. Eu notei nessa experiência que quando são os próprios estudantes tentando convencer os outros colegas de alguma coisa isso se torna mais eficiente. Eles fizeram afirmações para os colegas como as que seguem: “a gente quando vai a festas de colegas nossos em outros bairros e eles perguntam pra gente onde estudamos, quando falamos que é no Glória Marques eles dizem assim: nó, aquela escola toda pichada?!”; “a gente tem que ver que se a gente fizer coisas assim a gente pode participar de bons projetos na escola”. Eu refletia com os estudantes que a sala pichada como estava era uma herança que eles tinham recebido das outras turmas que haviam estudado ali antes deles e que eles deveriam pensar sobre a herança que eles gostariam de deixar para as outras turmas que viriam depois deles.
O apoio dos professores
Conversamos com a direção da escola sobre este projeto e logo ela topou o desafio. Também houve apoio do grupo de professores de artes e educação física. Outros colegas que cederam suas aulas para que as salas pudessem ser limpas foram: o professor Maurício de matemática, o Teobaldo, professor de historia, a Rita, a Geruza de matemática.